Privatização da Sabesp: entenda como funciona um follow on e saiba como fica a empresa


Nova oferta de ações fará com que o Governo de São Paulo deixe de ser o controlador da empresa, mas manterá o poder de decisão do Estado ao lado de acionistas de referência. Para investidores, aporte pode alavancar os projetos de investimento e acelerar ganhos da empresa. Bairros de alto padrão na Grande São Paulo são abastecidos por sistemas isolados, que garantem o abastecimento de água na região; operação também é feita pela Sabesp
Victor Moriyama/G1
De acordo com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) deve ser privatizada via follow on. O mecanismo nada mais é que uma nova oferta de ações na bolsa de valores, que reduz a participação total do governo na empresa.
A estratégia foi divulgada nesta segunda-feira (31), mas ainda não tem data para ser efetivada. A ideia central, contudo, é que o Governo de São Paulo deixe de ser o acionista controlador da empresa, em troca de aporte financeiro de novos acionistas.
Segundo o governador, a oferta pública permitirá a possibilidade de criar acionistas de referência da empresa — ou seja, grupos controladores da gestão por terem parcelas maiores das ações, o que manteria inclusive o governo como um dos tomadores de decisão.
Desta forma, a Sabesp teria um reforço de caixa para, segundo o governo, antecipar as metas de universalização previstas no marco do saneamento, de 2033 para 2029, além de uma injeção de R$ 66 bilhões em investimentos.
Ainda de acordo com o governo, os recursos também serão usados para modernização de Estações de Tratamento de Esgoto (ETEs) e Estações de Tratamento de Água (ETAs), além de instalação de duas usinas de dessalinização de água nos municípios de Guarujá e Ilhabela.
Os investimentos beneficiarão 10 milhões de pessoas em São Paulo, incluindo moradores de áreas rurais e de ocupações urbanas irregulares.
Atualmente, o Estado de São Paulo é dono de 50,3% das ações da Sabesp (aproximadamente 343,8 milhões de papéis). A fatia que ficará no bolso do governo de São Paulo ainda não está definida.
O g1 conversou com especialistas para entender se vale a pena comprar as ações durante o processo de privatização e quais são os riscos para os investidores.
O que é o follow on?
A Sabesp é uma empresa de economia mista. Isso significa que ela tem capital aberto, mas ainda é controlada pelo Governo de São Paulo. A empresa fez sua oferta inicial pública de ações (IPO, na sigla em inglês) em 2002.
Agora, a empresa realizará um follow on, que é uma oferta secundária de ações na bolsa. Assim, os 50,3% detidos pelo governo serão diluídos, fazendo dele um acionista minoritário. As determinações sobre os próximos passos do processo ficarão a cargo da Secretaria de Parcerias em Investimentos.
Vale destacar que o processo de privatização não se dá apenas pela venda de ações. Primeiro, para acontecer, ele precisa de uma autorização legislativa — e o TCU (Tribunal de Contas da União) ainda não aprovou o processo.
Como comprar ações no follow-on?
Existem dois tipos básicos de follow on, que se dividem em restritos ou públicos. Para os restritos, a empresa costuma procurar diretamente investidores institucionais para grandes aportes, em troca de parcelas de participação na empresa. Entre os públicos, a oferta é realizada para todo o mercado, inclusive entre acionistas da empresa.
O modelo da Sabesp ainda será detalhado, mas o governo diz que será público apesar de procurar ativamente por acionistas de referência para tocar as decisões de negócio.
Acionistas de referência são aqueles que detém uma quantia relevante de ações, que lhe confere participação suficiente para influenciar a gestão da empresa.
Queremos investidores de referência e parceria de longo prazo.
Vale a pena comprar Sabesp?
Em geral, analistas de mercado veem a privatização da Sabesp com bons olhos. São dois os fatores principais: a possibilidade de reforço do caixa da empresa para investimentos e um ambiente mais benigno para empresas do setor, depois da aprovação do Marco do Saneamento Básico.
O marco prevê mecanismos para ampliar, em índices próximos a 100%, a rede de fornecimento de água potável e de coleta de esgoto pelo país até 2033. Também estabelece estímulos para a presença do setor privado, em ambiente que era dominado pelas estatais.
Em maio, a Câmara dos Deputados derrubou dispositivos modificados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no marco legal do saneamento básico. Os decretos de Lula, que acabaram revertidos, flexibilizavam pontos das regras de concessão e exploração dos serviços de coleta de esgoto e tratamento de água nas cidades brasileiras.
“Em dezembro de 2022, optamos por retirar a Sabesp da Carteira Top 5 porque temíamos que eventuais discussões sobre mudanças regulatórias no mercado de saneamento poderiam limitar o potencial de valorização da companhia no curto prazo. Após observar os desdobramentos dessas discussões, agora estamos mais confiantes nas perspectivas para o setor de saneamento”, dizia um relatório do Itaú Unibanco à época.
De lá para cá, e com perspectivas de privatização da Sabesp desde a eleição de Tarcísio, os papéis tiveram valorização relevante.

Ainda assim, alguns fatores estão na mesa. De acordo com Alberto Mattos de Souza, Especialista em Negociações Estratégicas do PMMF Advogados, não é só o valor das cotas que deve ser levado em conta ao cogitar um investimento em empresas como a Sabesp.
O setor de saneamento, juntamente com os segmentos de energia elétrica e gás são chamados de setores de utilidades públicas e costumam estar menos sujeitos às variações econômicas. Justamente por esta característica, costumam ser empresas pagadoras de dividendos regulares.
Mattos de Souza levanta ainda duas variáveis a serem analisadas. A primeira é saber se haverá a interferência do Estado na operação da empresa, e mesmo no processo de privatização. O próximo passo será a aprovação pelo órgão regulador (Alesp), e, segundo expectativas do governo, a venda poderia ser concluída no primeiro semestre de 2024.
O processo poderia atrasar e sofrer questionamentos, como vêm acontecendo com o caso de privatização da Eletrobras.
“A Sabesp teria acionistas de referência, inclusive o governo de SP mantendo posição relevante. A vantagem dessa diferença é evitar o questionamento que se faz sobre a Eletrobras, onde o governo possui 45% das ações, mas vota como 10%. Será ainda discutido a possibilidade de o estado possuir uma ‘golden share’ com poder de veto para algumas decisões”, diz um relatório da Genial Investimentos.
Já a segunda variável apontada por Mattos de Souza é a definição do preço das ações da companhia. “A precificação leva em conta diversas premissas que precisam ser bem entendidas e avaliadas pelos investidores. Além disso, entender as particularidades do setor e adequar tudo ao perfil do investidor é fundamental para a tomada da melhor decisão”, diz.
Carlos Honorato, professor da FIA Business School, concorda que processos de privatização geram um momento de insegurança, pela “guerra de liminares” e ações de contestação do processo na Justiça, mas que o negócio pode ser benéfico para o investidor.
Empresas privatizadas tendem a ter uma dinâmica melhor na gestão. Isso não significa que a Sabesp não tenha tido isso nos últimos anos, mas ela tende a ser mais ágil no que precisa ser executado.
O que a privatização muda para os clientes?
Na teoria, o aporte financeiro que entraria na Sabesp com o processo de privatização pode alavancar os projetos de investimento e acelerar a entrega de projetos de saneamento.
Críticos, contudo, apontam que serviços privatizados podem ficar mais caros ao longo do tempo, pois as empresas precisam responder às pressões de acionistas. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), foi oponente de Tarcísio na campanha para o governo do Estado e, à época, criticou a proposta, dizendo que a conta de água seria aumentada.
O Governo de São Paulo, contudo, afirma que a privatização trará:
R$ 66 bilhões em investimentos para universalizar o acesso a água e esgoto coletado e tratado dentro dos 375 municípios atendidos pela companhia;
uma redução dos custos operacionais da empresa e compartilhamento do ganho de produtividade na forma de redução tarifária;
a antecipação a universalização do saneamento de 2033 para 2029;
a modernização de Estações de Tratamento de Esgoto (ETEs) e Estações de Tratamento de Água (ETAs) em toda a área de cobertura da Sabesp;
a melhora de tratamento de água e redução da poluição do rio Tietê;
a instalação de duas usinas de dessalinização de água nos municípios litorâneos de Guarujá e Ilhabela;
a possibilidade de expansão para que a Sabesp se transforme em uma “plataforma de serviços com atuação nacional e continental”.
* Com colaboração de Raphael Martins

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